Há um silêncio entre as teclas — um espaço que antecede o toque, como o instante antes de um beijo. Cada letra, como uma pele diferente, reage ao meu dedo de uma forma única. Algumas resistem, outras se entregam. A máquina de escrever, assim como o corpo, guarda em si o mistério do que será dito — e do que será sentido. Escrever é tocar. E tocar é decidir: se vou nutrir ou degradar. Às vezes, penso que as palavras têm textura. Há frases que escorrem como mel, outras que arranham como vidro. Depende do estado do mundo dentro de mim — e do mundo que toca em mim. Porque é isso que o toque faz: revela, convoca, denuncia. O universo inteiro vibra entre o que nos eleva e o que nos consome. Já vivi toques que curaram feridas que nem eu sabia que existiam. E também vivi carícias que me deixaram mais só do que o silêncio. O mesmo gesto, a mesma intenção aparente — mas em direções opostas. Tudo depende de quem toca. E de como escolhemos ser tocadas. Escrever, pra mim, é isso: um campo de sensações. A máquina responde como o corpo responde — com verdade. Ela não mente. O papel não finge. Se a palavra vem amarga, não há flor que a disfarce. Mas quando vem doce… ah, quando vem doce, parece que o próprio universo suspira. Como se cada letra quisesse prolongar aquele instante. Como se o tempo parasse um pouco, só pra sentir. Há palavras que acendem lugares dentro de mim que nem eu sabia nomear. E quando isso acontece, eu não estou apenas escrevendo — estou sendo escrita também. Talvez por isso eu ame tanto essa dança entre os dedos e as palavras. É uma troca de intimidades, um ritual silencioso que revela mais do que qualquer confissão dita em voz alta. Cada texto que nasce de mim carrega um pouco da mulher que fui naquele instante. Uma versão minha que só existiu ali, entre uma tecla e outra, entre o desejo de dizer e o medo de ser lida demais. E mesmo assim, eu escrevo. Escrevo porque preciso sentir. Escrevo porque há um prazer inegável em transformar toque em linguagem. E linguagem em presença. Como se o papel se tornasse pele. Como se o leitor, mesmo distante, pudesse me tocar de volta com os olhos.
